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Carta de uma trans e gorda

  • tdeque1
  • 13 de fev. de 2015
  • 4 min de leitura

Ismael Nery - Andrógino

Olha! Me chamo Leda Valentinne, tenho 19 anos, sou carioca e sou mulher trans. As pessoas me perguntam assustadas: ”Como é viver assim?”, “Você sabe que você vai morrer sozinha, não é?” E ao se referirem a mim, me olham da cabeça aos pés como se estivesse estampado em seus olhos:”Nossa, você não parece homem, mas nem mulher. Que confusão! O que você é realmente?” As vezes pelo pensamento do ser humano, somos tratadas até como aberrações e não, não sou reconhecida como cidadã de bem. Aconteceu uma vez, onde consegui arrumar um emprego, pra conseguir pagar a minha transição e poder me sustentar, o emprego era algo dos sonhos, onde me tratavam pela forma como sou e como me enxergo e passaram a respeitar e me tratar pelo nome social, porém nem tudo é ouro, não é?! Pois é, fui demitida dessa empresa, porque uma mulher CIS, acabara de ser efetuada pra ocupar o cargo onde eu trabalhei, eles até alegaram falando que:”Nao são transfóbicos e que infelizmente tiveram que ter essa atitude, por ela ser mulher e eu não” e é uma das coisas que, infelizmente ouvimos e estamos cansades de engolir o famoso :”Não sou transfóbico, mas…” Eu por intermédio desta carta quero desabafar o quanto eu, como mulher trans e gorda, estou me sentindo tão mal, por essa sociedade onde o que o patriarcado faz é nos submeter, infelizmente por conta do patriarcado eu sou vista como invisível e muitas das vezes até mesmo dentro do próprio movimento, onde eu deveria ser representada, sou taxada de homossexual, sou taxada de homem que se veste de mulher. Eu estou cansada, de ser tratada como “o tal fulaninho” que se veste de mulher, que “virou” travesti pra fazer programas. WOW! Pera lá amiguinho, eu sou gente, sou um ser humano e infelizmente muitas irmãs optam o caminho da prostituição, porque dentro de uma universidade não conseguem ocupar uma vaga, porque a sua concorrente CIS já ocupou, quantas trans hoje em dia não trabalham, não tem um futuro garantido e não pode nem concluir o ensino médio, porque foi retirada a força do colégio por preconceito da sociedade? Nos padronizam a um estilo, a um só gênero, querem que abaixemos a cabeça pra isso, pra poder viver em sociedade enquanto muitos falam:”Você não tem que agradar ninguém” e lá fora quer criticar a forma como eu peço respeito. Agora medite, caro leitor desta carta, se te tratassem com violência e a unica coisa que você pedisse fosse o respeito e lutasse por isso com todas as suas forças, qual atitude você tomaria? Qual atitude você teria para essas situações? Onde a sua dor se torna invisível até mesmo em movimentos que deveriam abranger você e enquanto tem irmãs trans morrendo ai a fora por gente CIS, quando abrimos a nossa boca pra falar somos a culpada e caem matando em cima da gente, por quê? Pelo simples fato de ser mulher trans! Acordo todo dia cedo, a primeira coisa que faço é sentir a luz do sol bater no meu quarto, enquanto invade a janela, porém já acordo pensando:”Será que irei sobreviver hoje?” É a unica pergunta que toma a minha cabeça durante todo O DIA, e é a mesma pergunta com inúmeras formas de imaginações da minha morte, porque eu estou vulnerável a morrer a qualquer momento por um/a cis e quando falo de morte, não falo apenas em agressões físicas, gente as palavras, elas ferem mais do que um tiro que sai pela culatra, as palavras são um tipo de coisas que me mata a cada dia, a forma como me olham nas ruas, me mata a cada dia e tem matado inúmeras trans pelo Brasil e o mundo a fora e você o que você tem feito? E não, não to fazendo esta carta pra fazer vitimismo ou pra que você peça desculpas, até porque as suas descupas não são pra aplaudir e sim não faz mais do que a sua obrigação! Só quero desabafar por intermédio desta carta, o quanto é difícil lidar com a vida sendo uma mulher trans, dentro da sociedade sofro da transmisoginia, da misoginia, levo ponta pés e chutes, tenho que aturar piadinhas dentro de um transporte público lotado, as 6 da manhã pra ir trabalhar e tirar do suor do meu rosto o meu sustento, já que um pai e uma mãe, os quais deveriam ser os dois papéis importantes pra mim, não estão presentes e resolveram se afastar por conta disso, justo as duas pessoas que eu mais precisava e esta ai se concretizando o que muitas pessoas falam:”Ser trans é ser solitária” e isto é uma verdade e vocês não sabem o quanto me matam a cada dia por essas coisas. Mas, não me dou por vencida, sei que tenho um grupo a representar, já que até dentro de um movimento feita pra mim, minha luta e minha dor é apagada, porque uma cis entrou na minha frente e tem sido assim no cotidiano, em mercado de trabalho, filas, escolas, universidades e afins. Hoje, eu percebo o peso da responsabilidade que tenho em minhas mãos em representar o emponderamento trans no Brasil, sendo uma das poucas mulheres trans a fazer o ENEM, passar pra prestar um curso em uma faculdade Federal do estado do Rio de Janeiro e além de passar pra prova do Tribunal/TJ e poder trabalhar lá dentro, em volta de vários e muitos homens, porém eu sei que se não começarmos a fazer isso, não é por palavras que iremos vencer e sim pelas atitudes e eu vejo que eu fazendo isso, eu estou construindo caminhos pra que outres irmxs trans, possam entrar no mercado de trabalho e ter uma vida melhor, poder ter ânimo de vida, já que muitas a perderam, pelo medo de sair de casa, por conta da exclusão da sociedade. OIha, eu já cansei de falar sobre representatividade trans, já cansei de falar sobre a questão de que, a cada dia uma cis nos mata, a cada dia morre uma trans porque um cis fez questão de matá-lo, a cada dia o percentual de “aberrações”, como assim somos denominadas, diminui e cada vez mais a intolerância e a violência crescem e o que mais me chateia é que dentro do meu movimento, de um movimento feito pra mim e por mim, eu tenho que abaixar a cabeça ainda pra opressor, tendo que me submeter e isso é lamentável!

Carta cedida pela própria Leda.

Obrigade e força, Leda!

 
 
 

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